Thursday, February 10, 2005


Li este poema num livro da Margaret Atwood, não descansei enquanto não o traduzi, foi a maneira mais simples de me tentar ver livre da bofetada que ficou colada na cara

I

Somos duros um com o outro
e chamamos-lhe honestidade
escolhendo as nossas verdades dentadas
com cuidado e apontando-as através
da mesa neutra

As coisas que dizemos são
verdadeiras: é o nosso alvo
retorcido, são as nossas escolhas
que as tornam criminosas.

II

Claro as tuas mentiras
são mais divertidas:
porque as fazes novas de cada vez

As tuas verdades, dolorosas e chatas
repetem-se continuamente
se calhar porque és dono
de tão poucas

III

Uma verdade deveria existir
não deveria ser usada
assim. Se eu te amo

é isso um facto ou uma arma?

O corpo mente
ao mover-se assim, são estes
toques, cabelos, o mármore
macio e húmido que a minha língua percorre
mentiras que me estás a dizer?

O teu corpo não é uma palavra,
nem mente
nem fala a verdade

Apenas
está aqui ou não está.


Margaret Atwood


Wednesday, February 9, 2005

A noite sustém-se

sem respirar, tal como um esforço.

Mais devagar, sem brisa

benevolente que num instante aviva

o duvidoso cansaço, precipita

a solução do sono.

De umas luzes iguais

vela alta parede de janelas.

Carne sozinha insone, corpos

como a mão decepada jazem,

debruçam-se, buscam o amor do ar

- e a brasa que esgotam ilumina

olhos onde não dorme

a ansiedade, a infinita esperança com que aflige

a noite, quando volta



Jaime Gil de Biedma





Monday, February 7, 2005

Bom Carnaval





Sunday, February 6, 2005



Uma espécie de vazio



A imagem estendia-se

com surpreendente realidade



Pensei: é a montanha

que nunca tinha visto



Como nessa manhã

em que o seu perfil me surpreendeu



a sua imanência



Agora não me importa

porque me esvaziei



Não obstante sinto a falta

a intensidade dos meus pertences



Sinto um vazio

uma espécie de vazio



mesmo na luz

iridiscência



- malvas laranjas -



da inapreensível realidade



Yolanda Pantin





Friday, February 4, 2005



Ser soñadora en su camisa azul

que ama la tierra extraña

o atreverme como la náufraga

que vuelve al mar

porque nadie se alegra

de su salvación.



Alejandra Pizarnik





Thursday, February 3, 2005

lebre completamente deliciada com o diário da Frida Kahlo



Wednesday, February 2, 2005

É mais fácil de longe imaginar

o que seria ter-te aqui presente

do que seria ter-te e não saber

com que forma do corpo receber-te.



Talvez um amplo véu oriental

ou o brilho mental de uma armadura

me deixassem arder sem ser molesta

no lume horizontal de uma figura.



Se te vejo, já está o meu desejo,

enquanto estavas longe, satisfeito;

no teu olhar encontro tudo quanto

à altura de amor é mais perfeito.



E no entanto, perto, fico incerta

se não é melhor bem o que imagino.



António Franco Alexandre