Wednesday, June 30, 2004

para um zuluzinho



CLARIDADE DADA PELO TEMPO



III



Viver com a crueldade

da criança que

tira os olhos ao pássaro



um desconhecido

movendo-se constantemente

no deserto

em que cada pegada deixa

bem marcada na areia

a imagem

dessa outra existência

em que a morte e a memória

ainda nada significam



mais alto



muto mais alto talvez

que a claridade

do voo das aves que

partem para o desconhecido



o próprio corpo nada mais é

do que a sombra bem simples por sinal

em que,

por erro nosso ou dos outros,

já não existe

a persistência do que

foi perdido



e as mãos

as mãos que sentimos

bem presas seguras aptas

essas

todos sabemos

que podem ainda cada vez mais

esmagar com cuidado

com extremo cuidado

dilacerar suavemente



nos olhos

está o amor



Mário-Henrique Leiria





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