Tuesday, November 9, 2004





Banho-me na luz calma duma gota

e lembro como fui educada:

Um lápis na minha mão,

a mão fresca da mãe na minha, tão quente.

E então escrevíamos

para dentro e para fora dos recifes de coral

um alfabeto submarino de curvas e de pontas,

de espirais de caracol, de tentáculos de estrelas-do-mar,

de braços esgrimindo de polvos,

de grutas arqueadas e de formações de rochas.

Letras que cintilaram e acharam o caminho,

vertiginosas por cima do branco.

Palavras como peixes achatados que se remexeram

e se enterraram na areia

ou anémonas-do-mar oscilantes, com centenas de fios

em movimento calmo, de uma assentada.

Frases como correntes de peixes

que ganharam barbatanas e se ergueram,

ganharam asas e se moveram, cheios de ritmo,

pulsando com o meu sangue que, suavemente,

opôs estrelas ao céu nocturno do coração.

Vi, naquele momento, que a sua mão havia largado a minha,

que a minha escrita me livrara há muito das suas garras.





Pia Tafdrup







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